quinta-feira, 22 de junho de 2017

Pepe Mujica - Alimentação saudável: um direito de todos e de todas

Esses dias me dei conta que apesar de ter ido e vivenciado o espaço e as falas na 2a. Feira nacional da reforma agrária que aconteceu aqui em São Paulo em maio desse ano, não falei nada à respeito dessa experiência. Que foi única. Comovente.
Estive no parque da Água Branca, no dia 7 de maio, data escolhida para aproveitar não só a feira em si, mas para ouvir o que Pepe Mujica tinha a nos falar na Conferência sobre alimentação saudável que aconteceu no mesmo dia. Ele não era o único mas, certamente, era quem eu mais queria ver e ouvir.
Nesse espaço físico e temporal que vivemos, onde a intolerância impera, onde é mais fácil aceitar manchetes que desenvolver pensamentos próprios e críticos, ter a oportunidade de ouvir a visão de mundo de um ser humano como ele é algo pra se saborear.
Comecei a escrever esse texto pensando em falar sobre todos os enganos e engôdos que nos são vendidos diariamente no que diz respeito ao que nos alimenta. Pensando em escrever sobre como a nossa comida vem do pequeno, do familiar. De como a monocultura não nos alimenta e destrói o meio ambiente. De como as grandes corporações nos vendem praticidade em forma de mentira. De como é mais importante ter terra pra gente, do que pra gado. De como é possível impactar a cadeia de consumo com as nossas escolhas. Mas não vou falar disso não...vou só reproduzir aqui, em vídeo  e trechos que me pegam, o discurso do Mujica.
Espero que gostem!

"Companheiros queridos, no fundo essa não é uma luta pela terra, sendo mais uma luta por uma civilização distinta. Construímos megalópoles e o pobre homem e a mulher demoram todo dia 3 horas para ir ao trabalho e a mulher também tem que sair para trabalhar porque o salario não é suficiente, e não têm tempo para ser livre. Vão passar no supermercado e comprar (?), e vão comer comida ruim, e vão hipotecar a cultura da cozinha, de onde se arrancou a cultura humana, e vão deixar esse lugar por que não tem tempo, porque o mercado roubou o tempo de sua vida (...) Os saltos qualitativos do conhecimento e da ciência se prostituem, a transgênese não é má, o mal é que a dominam Monsanto e Dupont e não o povo (...) Não é má a ciência, é mal o luxo da ciência para servir ao mercado e não à vida. (...) Não há crise ecológica, a crise ecológica é consequência da crise política e cultural, (...) O que quero dizer é que toda nossa cultura prática está embebida de consumismo, de desperdício de energia (...) Se você não compra, o mercado se paralisa, se você não consome, não paga crédito, não paga contas, não há ganancia. Nossa cultura não é funcional à espécie, é funcional ao negócio (...) Como não vou defender a agricultura campesina? Meus irmão cantam, sou campesino de alma e oficio até hoje e vou morrer amando a terra, é mais fácil nascer um engenheiro que um campesino de alma, e não é que o agricultor seja melhor ou pior, há melhores e piores, é apenas diferente. Não sentem saudade da cidade, se sentem felizes no amanhecer da natureza, falam com as plantas e as cores, não se sentem só porque o campo é um coletivo de vida. Mas é preciso olhos para enxergar e alma para sentir. É diferente (...) É nos aromas da cozinha onde começa a cultura(...) A luta pela terra é a luta pelo todo (...) As megalópoles são a negação, são o cultivo da solidão no meio da multidão e o enterro da cultura, são um invento da propriedade imobiliária, do interesse e da ganancia (...) O homem tem medida. Não se pode ter 2 milhões de afetos, o homem tem limite. E temos que fazer coisas para a vida, para a humanidade e não para os negócios (...) Já fui jovem e quis mudar o mundo, fui sonhador, creio que o mundo pode ser mudado mas temos que acumular gerações de lutadores. Lutadores sociais. Lutadores políticos. O homem é gregário, não pode viver sozinho tem que criar coletivos que lutam (...) Todo progresso humano e social está precedido por derrotas de gente que não foi compreendida mas arregaçou as mangas e se afirmaram na história da humanidade, mas temos que aprender que o triunfo verdadeiro é voltar a levantar-se cada vez que se cai. é voltar a recomeçar. Porque não há terra prometida ou paraíso perfeito (...)Por isso parabenizo o poeta do movimento sem terra, verdadeiro poeta da geração porque luta por uma causa justa em um país de origem feudal que repartiu a terra com critério feudal e condenou à pobreza uma multidão de pessoas de principio (...) A terra não deve ser propriedade privada, deve ser de uso. Não possuímos a terra, é a terra que nos possui, já estava antes e estará depois das loucuras desses que andam por ai (...) Por isso digo companheiros uma cultura sábia aprende a andar leve pela vida, sem muito compromisso material. Não é apologia à pobreza, é apologia contra a sociedade de consumo (...) A humanidade nunca teve tanto quanto hoje. Há 32 pessoas que possuem o mesmo que 300 milhões de latino americanos mas o pior é que sua fortuna pessoal segue crescendo a taxas de 20 - 21% ao ano. A riqueza se concentra cada vez mais, isso não quer dizer que o resto do mundo está mais pobre, quer dizer que a distancia entre o piso e o teto é cada vez maior, e essa distância de concentração econômica se traduz em poder politico e o poder politico retroalimenta a concentração da riqueza e o uso da tecnologia. Necessitamos de um estado (...) que invista à frente por um novo caminho. A natureza tem herbicidas. Eu poderia nomear várias espécies que produzem herbicidas na luta pela vida (...) mas isso não deve ser negócio da Monsanto e Syngenta. Os estados precisam se impor e investigar, e usar o conhecimento a favor da vida humana e não do mercado (...) Não temos o direito de falar em ecologia se não somos capazes de enfrentar o vício que nos impôs o capitalismo, nesse mundo como é hoje temos que aprender a viver como pensamos, porque ao contrário acabaremos pensando como vivemos (...)